Contra o trabalho escravo no Brasil

Contra o trabalho escravo no Brasil

Quando se fala de coiotes aliciando e atravessando imigrantes ilegais, logo se imagina um grupo de pessoas que, em busca do “sonho americano”, enfrentam os riscos para atravessar a fronteira entre México e Estados Unidos. Mas na verdade esta é uma realidade tão próxima ao dia a dia dos paulistanos que, muitas vezes, é até difícil acreditar.

Infelizmente é comum, de tempos em tempos, os veículos de comunicação noticiarem algum tipo de operação policial que, por consequência de uma longa investigação, flagrar oficinas de costura clandestinas que utilizam trabalho análogo ao escravo e que terceirizam mão de obra para grandes marcas do mercado da moda nacional. Algumas das marcas que já foram flagradas praticando esse tipo de crime são: C&A, Marisa, Pernambucanas e, mais recentemente, Zara, Tyrol, Gregory, Cobra d’Água, Billabong, Ecko e Brooksfield.

Empresas de renome nacional que terceirizam sua mão de obra com fábricas clandestinas. Na sua grande maioria, essas firmas aliciam bolivianos, peruanos e paraguaios que, em seus países, vivem abaixo da linha da pobreza e, em busca de melhores condições de trabalho e de vida no Brasil, submetem-se a atividades subumanas em oficinas, normalmente localizadas nos bairros do Brás e Bom Retiro, no centro de São Paulo.

Vindos de regiões andinas da Bolívia ou cidades do interior do Peru e Paraguai, os trabalhadores cruzam a fronteira com o Brasil, por Corumbá, no Mato Grosso do Sul, e se instalam nas oficinas de costura paulistanas, onde moram e realizam uma jornada de trabalho que vai das 6h às 22h diárias.

A União Geral dos Trabalhadores-UGT, entidade que luta pela manutenção e ampliação dos direitos da classe trabalhadora, está empenhada em combater essa prática. “Já está na hora de darmos um basta nessa prática que acontece aqui nessa que é a cidade mais rica do Brasil. A escolha por imigrantes não se resume em os trabalhadores brasileiros rejeitarem as vagas de emprego do setor têxtil ou os imigrantes serem qualificados, a questão é cultural, pois a barreira da língua e dos costumes, somada ao receio de uma possível extradição, são pratos cheios para os exploradores”, explica Ricardo Patah, presidente nacional da UGT.

Explorados e sem salários

Muito além das condições precárias laborais, o excesso na jornada de trabalho e o descumprimento dos direitos trabalhistas, a remuneração desses trabalhadores é uma equação à parte e que não pode ser pesquisada em nenhum livro de matemática existente.

Uma determinada fábrica vende cada peça de roupa a 30 ou 40 reais para as grandes lojas varejistas, mas paga para uma oficina clandestina de 2 a 3 reais por peça. Essa oficina clandestina repassa aos trabalhadores de 0,30 a 0,60 centavos por peça de roupa feita.

Contudo, o trabalhador precisa pagar ao dono da oficina o valor de sua passagem até o Brasil, o que custa em torno de 1.500 reais, somados ao aluguel e alimentação consumidos diariamente.

Essa jogada faz com que os trabalhadores, que recebem por peça feita, não interrompam a linha de produção e, assim, fiquem semanas ou até meses sem sair de casa para conseguir produzir mais para pagar suas dívidas que não param de crescer e, consequentemente, nunca conseguem pagar.

“Quando um latino-americano vem para São Paulo é para buscar melhores condições de vida, mas eles estão sendo muito explorados, principalmente pela indústria têxtil.

Quando o imigrante sai da sua terra, já tem em mente que terá de trabalhar 15 ou 16 horas por dia. O que está acontecendo é que a terceirização, aqui no Brasil, virou sinônimo de escravidão e isso precisa mudar”, observa Rene Cesar Barrientes Camargo, presidente do Instituto de Cultura e Justiça da América Latina e do Caribe – ICUJAL.

A luta

Por melhores condições laborais para essas pessoas que deixam sua terra natal em busca de melhor qualidade de vida no Brasil, é de fundamental importância a participação dos sindicatos e entidades de classe nesta luta. Desta maneira, a UGT intensificou as ações em busca do cumprimento das leis trabalhistas do Brasil, para a classe trabalhadora brasileira e para os imigrantes que aqui residem e trabalham.

Segundo Ricardo Patah, presidente da UGT, os casos de trabalho análogos à escravidão surtem efeito negativo em relação à imagem brasileira no mundo e isso influencia, também, a economia do País. “A escravidão não é somente um crime contra o trabalhador, mas sim, é um atentado à humanidade e à nação brasileira”, diz o sindicalista.

“As entidades sindicais são essenciais para a mobilização da sociedade civil. A UGT e o Sindicato dos Comerciários de São Paulo estão cumprindo um papel muito importante no sentido de assumir um posicionamento público que sensibili-za a sociedade, mas não apenas isso, pressionam os poderes públicos a, efetivamente, cumprirem as suas funções”, diz o deputado estadual Carlos Bezerra Jr., que pediu a abertura de CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), na Assembleia Legislativa, para investigar denúncias de trabalho escravo no Estado de São Paulo.

Um pedaço da Bolívia Brasileira

Como forma de suprir as necessidades de cultura e lazer da comunidade, a Praça Kantuta, aos domingos, é um reduto boliviano, em pleno centro de São Paulo, que fica a poucos metros do metrô Armênia, no bairro do Pari.
Dentre as várias barracas de comida, os cabeleireiros e os grupos musicais, o idioma oficial é o espanhol e o guarani. É um local onde o futebol, realizado na quadra, se contrasta com as cores das malhas de lã de lhama do vestuário dos artistas que, em um palco de madeira, ensaiam uma apresentação de dança ao som de flautas de pã. Com o formato de feira ao ar livre, a hospitalidade local nos transporta a cidades como La Paz e, com certeza, cumpre seu objetivo de levar os imigrantes para mais perto de suas raízes.

Da Redação UGT

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